Imagem GZH - Vídeo mostra o assalto

ataque ao carro-forte número 2991 da empresa TBForte Segurança e Transporte de Valores, que abasteceria caixas eletrônicos em um supermercado em Guaíba, na antevéspera do Ano-Novo, envolveu um esquema com requintes de planejamento, mão de obra qualificada e informações privilegiadas: entre os suspeitos identificados pela Polícia Civil estão dois criminosos que eram monitorados por tornozeleira eletrônica, ao menos um funcionário da empresa dona do blindado e dois vigilantes que trabalhavam em outra firma de segurança.

Na manhã desta quarta-feira (25), a 1ª Delegacia de Repressão a Roubos, do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), realiza a Operação Pavão para cumprir — em nove cidades — 64 mandados de busca e apreensão e nove de prisão contra suspeitos de participação no crime. Bruno Rafael Reis, que era o chefe da equipe que sofreu o assalto, foi preso ainda na noite da terça-feira (24). No dia do ataque, outro vigilante, da empresa Geseg, havia sido capturado em flagrante.

Um dos principais procurados, Maurício da Silva, o Mauricinho ou Uca, apontado como mentor do assalto, escapou pelo telhado quando policiais chegaram em uma casa no bairro Fátima, em Canoas. Um quarteirão foi fechado, e as buscas foram reforçadas no local. Por volta das 7h15min, ele foi capturado: estava escondido dentro de uma churrasqueira. Até as 7h30min, seis suspeitos já estavam presos.

A investigação iniciada em dezembro esclareceu não só a identidade dos criminosos que atuaram diretamente na ação, mas também a de suspeitos de participar do fornecimento de armas e da estrutura logística e a de vigilantes que teriam colaborado com o plano.

O comprador do fuzil Imbel encontrado na Ilha do Pavão durante as buscas, por exemplo, é um homem com certificado de atirador, colecionador e caçador, do município de Getúlio Vargas. Ele comprou a arma legalmente e não há registro de que ela tenha sido roubada dele.

Conforme a apuração, quatro criminosos vestidos de policiais civis e usando uma viatura adesivada falsa foram os que participaram diretamente da ação no supermercado Nacional naquele 29 de dezembro de 2021. Destes, dois foram mortos em confronto com a Brigada Militar e dois conseguiram se embrenhar na Ilha do Pavão e escaparam: Maurício da Silva e Márcio Vargas, o Papa-Léguas.

Vargas foi o primeiro a ser identificado, já que agiu no assalto sendo monitorado por tornozeleira eletrônica. Enquanto policiais faziam cerco na ilha, o equipamento deu três vezes sinal da localização: o homem que deveria estar recolhido em casa, em prisão domiciliar na Vila Bom Jesus, na Capital, estava a cerca de 300 metros da sede do Grêmio Náutico União na Ilha do Pavão. Maurício, que havia rompido a tornozeleira e já era considerado foragido naquele dia, foi reconhecido por testemunhas e vítimas por meio de fotos.

Os criminosos que morreram em confronto com policiais militares foram identificados como Alexandro Rodrigues e Emerson da Silva Gerome. Com eles, a polícia encontrou kits de primeiros socorros, com remédios, como morfina, para o caso de serem feridos em ação.

Outras três pessoas atuaram como motoristas na fuga. Duas foram presas no dia do crime: José Cristiano Botelho Rodrigues, vigilante da empresa Geseg - Grupo Especial de Segurança, e Charles Porto Alaor. O terceiro condutor, que abandonou o carro na Ilha dos Marinheiros e teria escapado de ônibus, seria o também vigilante da Geseg Evertom Edwilson Rodrigues Penteado, que teve prisão temporária decretada pela Justiça a pedido da Delegacia de Roubos e segue sendo procurado nesta manhã.

Também teve prisão temporária decretada o chefe da equipe de seguranças do carro-forte atacado, Bruno Rafael Reis. Com ajuda da empresa, a polícia identificou uma série de "falhas" ocorridas no dia e que tornaram o acesso ao dinheiro do blindado mais fácil. 

A primeira delas foi o fato de os valores — um total de R$ 4.374.000 — não terem sido acondicionados como deveriam, ficando guardados apenas na sala cofre do veículo, enquanto deveriam ser fechados em compartimentos dentro desta sala, em cofres segregados. Essa era uma responsabilidade do vigilante Reis. Ele teve o suposto problema com os cofres ainda na base da empresa, mas não teria comunicado os superiores.

No trajeto para Guaíba, um dos seguranças do carro-forte desconfiou de um Jeep Renegade que os seguia e comunicou a equipe. O aviso foi desconsiderado. Quando o blindado fez a primeira parada em Guaíba, para deixar dinheiro em uma agência do Bradesco, novamente, o segurança comenta sobre uma viatura da Polícia Civil no local. O chefe da equipe diz ser um fato bom. Na verdade, já era a falsa viatura usada pelos criminosos. 

Ao chegar no supermercado, depois das verificações feitas pelos colegas, Reis desceu do carro-forte com dinheiro para abastecer os caixas-eletrônicos. Em depoimento à polícia, o motorista (o nome não é divulgado porque ele não teve prisão decretada, mas é investigado como suspeito) disse que, ao ver a viatura chegar, avisou os colegas via rádio e acionou o botão de pânico. Uma auditoria da empresa mostrou, no entanto, que o botão não foi ligado.

Quando os criminosos, trajados de policiais, abordaram a equipe dentro do supermercado, disseram que estavam ali porque os vigilantes teriam que retornar para a base. O motivo era de que um colega deles (o nome foi dado e se trata mesmo de um funcionário da empresa) estava com familiares sequestrados. Logo depois, anunciaram o assalto.

Reis seguiu mexendo no celular e foi o último a ser desarmado. Também chamou a atenção da empresa e da polícia o fato de que a câmera que ele tinha presa à parte da frente do uniforme foi desligada e, portanto, não gravou os rostos dos criminosos.

Ao voltar com um dos assaltantes para o carro-forte, o chefe de equipe bateu na porta pedindo abertura — o que contraria protocolos de segurança da empresa. A investigação apurou que o motorista largou a arma antes de abrir a porta, o que também fere procedimentos.

Câmeras externas registraram que o criminoso entrou no carro-forte com a arma abaixada, o que seria, segundo a polícia, um indicativo de que ele sabia que não haveria resistência por parte do motorista. A investigação também identificou contradições no depoimento de Reis, que teve prisão temporária decretada.

A Delegacia de Roubos ainda apura eventual envolvimento de outros funcionários da empresa no fornecimento de informações para o plano. Como o carro-forte já havia abastecido o Bradesco antes do assalto, foram levados pelo grupo cerca de R$ 3,7 milhões.

Quase todo valor foi recuperado por policiais durante a perseguição — a maior parte na Sprinter que estragou na BR-116 e foi abandonada, e um pouco com os criminosos mortos. O total efetivamente levado pelos homens que fugiram teria sido de apenas R$ 82 mil.

— A investigação criminal descortinou a existência de uma organização criminosa constituída e liderada por pessoas já investigadas em outras oportunidades, inclusive, pela própria Delegacia de Roubos. O papel de cada participante está bem delimitado. Desde a ocorrência do crime, diversas medidas de cunho investigativo foram empregadas. Houve contínuo esforço de cada um dos agentes incumbidos da investigação em apresentar um trabalho qualificado à sociedade. Há ainda muito a se fazer agora, a partir das dezenas de buscas cumpridas, analisar e concluir, mas chance dessas pessoas serem responsabilizadas criminalmente, com o que já se tem, é grande — destacou o delegado João Paulo de Abreu, titular da 1ª Delegacia de Roubos.

Fonte: gauchazh.clicrbs.com.br