RESUMO DA MATÉRIA
A pesquisa da HEC Montréal mostra que toda organização transmite, por suas ações, o que realmente valoriza — especialmente quando se trata da saúde e do bem-estar de quem trabalha. Com dados de quase três mil empregados, o estudo compara empresas a estágios de crescimento de uma planta, criando quatro perfis de clima organizacional:
1. Wasteland (terreno abandonado):
Organizações que quase não investem em saúde ocupacional. Iniciativas são raras, não há metas nem avaliação, e o cuidado é esporádico. Os trabalhadores sentem que precisam lidar sozinhos com o desgaste.
2. Sprouting (brotando):
Algumas ações de bem-estar aparecem, com apoio moderado da direção, porém sem diagnóstico estruturado ou metas claras.
3. Budding (gema):
A empresa já identifica necessidades, define objetivos mensuráveis e começa a avaliar e ajustar programas. O clima interno mostra sinais de mudança positiva.
4. Blooming (florido):
A saúde é tratada como estratégia central. Há programas sólidos, comunicação constante, liderança engajada e processos de diagnóstico e monitoramento contínuo.
O estudo explica que cada decisão da empresa — iniciar um programa, medir resultados ou simplesmente falar sobre o tema — funciona como um sinal do quanto o bem-estar realmente importa. Ambientes com investimento e suporte são percebidos como ricos em recursos, enquanto climas áridos geram sensação de perda, estresse e desgaste.
Ao comparar os perfis, os resultados são expressivos:
Empresas “wasteland” têm 93% mais dias de ausência que as “blooming”.
A intenção de pedir demissão é 19% maior nesse ambiente.
A exaustão emocional é 34% mais alta e a sobrecarga, 43% maior.
A satisfação no trabalho cai quase 12,7%.
A pesquisa conclui que saúde ocupacional eficaz não se resume a ações pontuais. O que faz diferença é integrar o tema à estratégia da empresa: identificar necessidades, definir metas, avaliar resultados e manter o assunto vivo nas práticas de gestão. Quando a liderança trata o bem-estar como prioridade estratégica, o clima organizacional melhora, o engajamento cresce e os efeitos aparecem tanto na saúde das pessoas quanto nos resultados do negócio.
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MATÉRIA COMPLETA
Toda organização conta uma história sobre o que realmente importa dentro do ambiente da empresa. Quando o recado implícito é que resultados vêm antes de qualquer coisa, inclusive da saúde de quem trabalha, o clima organizacional tende a se deteriorar como um terreno abandonado.
Um estudo recente conduzido por pesquisadores da HEC Montréal propõe exatamente essa metáfora: há empresas com perfil “wasteland”, um terreno baldio em termos de cuidado com saúde e bem‑estar, e outras em estágio de “floração”, nas quais o ambiente interno sustenta a vitalidade das pessoas. O estudo mostra, com dados de quase três mil trabalhadores, que essa paisagem simbólica não é só estética, ela se traduz em mais ou menos adoecimento, absenteísmo, sobrecarga e satisfação no trabalho.
O que a pesquisa mediu
O trabalho analisou 59 organizações de Quebec, em 17 setores econômicos, a maior parte de serviços, para entender como elas estruturam estratégias de saúde e bem‑estar no trabalho. Gestores de recursos humanos responderam a um questionário em escada de sete pontos sobre oito dimensões, que vão da existência de iniciativas de promoção de saúde ao modo como a empresa identifica necessidades, define metas, avalia e ajusta programas.
Com esses dados, os autores aplicaram uma análise de perfis latentes e identificaram quatro tipos de organização, batizados com estágios de crescimento de uma planta: “wasteland”, “sprouting”, “budding” e “blooming”. Depois, em 32 dessas empresas, 2828 empregados responderam a questionários sobre absenteísmo, exaustão emocional, sensação de sobrecarga, intenção de sair do emprego e satisfação geral, permitindo cruzar perfil organizacional e efeitos sobre a saúde.
Quatro perfis de cuidado com pessoas
O perfil “wasteland” reúne empresas que praticamente não investem em saúde ocupacional: quase não há iniciativas, o tema raramente aparece na agenda da direção e tampouco existem metas ou avaliação de resultados. É um clima organizacional em que o cuidado é episódico, quando existe, e em que os trabalhadores aprendem, na prática, que devem se virar sozinhos para lidar com adoecimento e desgaste.
No extremo oposto está o perfil “blooming”, em que a saúde de quem trabalha é tratada como eixo estratégico, não como acessório simpático. Nesses ambientes, há programas consistentes, apoio explícito da liderança, comunicação frequente sobre bem‑estar e rotinas de diagnóstico, monitoramento e ajuste das ações, o que sinaliza um clima de compromisso contínuo com as pessoas.
Entre um ponto e outro, a pesquisa descreve o perfil “sprouting”, em que algumas iniciativas começam a surgir, com apoio moderado da direção, mas quase sem diagnóstico estruturado ou metas claras. E o perfil “budding”, em que, além de iniciativas e conversas mais frequentes sobre bem‑estar, a organização já identifica necessidades, define objetivos mensuráveis e começa a avaliar e corrigir o percurso, um estágio intermediário, mas com clima interno em franca transformação.
Clima organizacional como sinal de cuidado
Os autores recorrem à teoria dos sinais para explicar por que essas diferenças estratégicas repercutem tanto na saúde dos funcionários. Toda decisão, de lançar ou não um programa, de medir ou não sua eficácia, de falar ou não sobre o tema nas reuniões, envia mensagens sobre o quanto a organização valoriza de fato o bem‑estar de sua equipe, compondo o tecido do clima organizacional.
Também se apoia a análise na teoria da conservação de recursos, segundo a qual pessoas adoecem mais quando sentem que seus recursos (tempo, energia, apoio, recompensas) estão sob ameaça constante. Ambientes em que a empresa investe em saúde, ajusta cargas de trabalho e oferece suporte são percebidos como contextos ricos em recursos, nos quais vale a pena engajar‑se; climas áridos, ao contrário, reforçam a lógica de perda, alimentando estresse e desgaste.
Quando o abandono cobra a conta
Ao comparar os perfis, o estudo mostra que o “wasteland” é caro, tanto para as pessoas quanto para o negócio. Funcionários que trabalham em empresas com esse perfil relatam 93% mais dias de ausência do que aqueles em organizações “blooming”, diferença que, em larga escala, se converte em perda de produtividade e custos expressivos.
A intenção de pedir demissão também é maior nesse terreno árido: trabalhadores do perfil “wasteland” relatam propensão 19% mais alta a buscar outro emprego do que seus pares em empresas “floridas”. Em um mercado de trabalho marcado por escassez de talentos, como lembram os autores, esse dado acende um alerta para organizações que ainda tratam saúde ocupacional como despesa e não como investimento estratégico.
Os efeitos subjetivos são igualmente contundentes: em empresas “wasteland”, os níveis de exaustão emocional são 34% superiores aos encontrados no perfil “blooming”, e a sensação de sobrecarga chega a ser 43% maior. Em paralelo, a satisfação no trabalho cai cerca de 12,7% nesse ambiente, compondo um cenário em que o clima organizacional favorece o cinismo, o afastamento e, em última instância, o desligamento.
Bem-estar como parte da estratégia
Um ponto central da pesquisa é mostrar que saúde ocupacional eficaz não se reduz a iniciativas pontuais, como uma palestra anual sobre estresse ou um benefício isolado de ginástica laboral. O que diferencia os perfis mais saudáveis é a capacidade de integrar o tema à estratégia de gestão de pessoas: mapear necessidades, definir metas, medir resultados, ajustar o que não funciona e manter o assunto vivo nas conversas formais e informais.

