Em uma rodovia de grande circulação da região de Campinas, entre 18h e 19h, dois veículos utilitários se aproximam e ultrapassam um carro-forte. Logo na sequência, através de dois buracos feitos no vidro traseiro, criminosos atiram contra o automóvel que está transportando pelo menos R$ 2 milhões. As armas utilizadas no assalto são de significativo potencial de dano — 5.56, 7.62 e .50, esta última capaz de abater aviões.
Após acuar motoristas e vigilantes, os assaltantes usam explosivos para acessar o interior do carro-forte e levar o dinheiro. Por fim, eles fogem por meio de estradas vicinais, abandonam os seus carros e deixam apenas o cenário de destruição, feridos e vias interditadas. Poucas pistas ficam para os policiais.
“Eles têm informação. No caso dos assaltos aí na região, [eles sabem] quando os carros-fortes vão passar, em qual cidade, quanto os veículos estão carregados de dinheiro. Então, eles dão o bote certo sempre. Você não vai se arriscar a fazer um crime como esse por nada”, apontou Guaracy Mingardi, analista criminal e ex-coordenador de análise criminal do Ministério Público do Estado de São Paulo.
Segundo Guaracy, os assaltos que aconteceram na região nos últimos meses se assemelham aos antigos ataques a bancos, mas com menos riscos e com compensação financeira mais interessante.
Cada integrante da quadrilha tem o seu papel, sendo que os motoristas dos utilitários e os responsáveis por manusear as armas são especialistas. Geralmente, pelo menos um integrante mora na região, já que é preciso conhecer as rotas de fuga — quase sempre estradas vicinais.
O horário do crime quase sempre é no fim da tarde, para facilitar a fuga. Tudo é planejado para dificultar o trabalho das viaturas policiais, que precisam enfrentar o trânsito e as táticas dos criminosos — que trocam de motorista para despistar a localização do dinheiro.
Por fim, Guaracy cita que esse tipo de quadrilha geralmente tem o suporte do PCC (Primeiro Comando da Capital), responsável por emprestar armas e carros, bem como passar informações estratégicas
“É uma quadrilha que usa meios violentos e que tem ligação com a organização criminosa. Não necessariamente eles são membros do PCC, não necessariamente o PCC está fazendo os roubos. Mas é gente que tem apoio do PCC”, disse.
Além da organização, há uma dificuldade para investigar esse perfil de crime. A Polícia Civil deve agir com base em informações ou em algum possível reconhecimento dos criminosos. Porém, de acordo com Guaracy, a corporação está cada vez mais sucateada e burocática.
“A Polícia Civil está com menos pessoas. Está com 30% de defasagem do efetivo. Está com policiais envelhecidos, então você não tem tantos investigadores de rua como deveria ter. Esse investigador de rua é necessário”, destacou.
O investigador de rua proporciona informantes à Polícia Civil para atuar contra o crime organizado. Os policiais também podem cruzar informações para tentar chegar aos líderes do grupo.
Todas as hipóteses têm sido trabalhadas pelo delegado divisionário da Deic (Divisão Especializada de Investigações Criminais) de Piracicaba, Marcel William Oliveira de Sousa. Ao LIBERAL, Marcel não detalhou como estão as investigações, mas disse que “estão caminhando”.
O que dizem as autoridades
O LIBERAL questionou outros órgãos quanto aos assaltos a carros-fortes ocorridos na região.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública disse que a investigação dos crimes é de responsabilidade da Polícia Civil do Estado de São Paulo, mas quando acionada pela unidade federativa, a pasta está à disposição para suporte operacional e de inteligência para quaisquer investigações.
Já a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo) destacou que os assaltos estão sendo investigados pelo Deic de Piracicaba, com os apoios da Delegacia de Polícia de Investigações sobre Furtos e Roubos a Bancos, delegaciais locais, Polícia Militar e guardas municipais.
Por sua vez, o DER (Departamento de Estrada e Rodagem) e a CCR AutoBAn afirmaram que não possuem a responsabilidade de monitorar crimes nas rodovias, mas investem para que as pistas tenham a infraestrutura necessária.
O SindFord (Sindicato dos Trabalhadores em Carro Forte, Transporte de Valores e Escolta Armada) foi procurado, mas não atendeu à reportagem.
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Fonte: O Liberal